POSSÍVEIS A MAIS
ARTICLES • 28-04-2017
POSSÍVEIS A MAIS

 


 

Às vezes é tanto o espaço que faz aflição.


Tudo possível, tudo oportunidades, tudo à disposição.

Este tanto armadilha. Imobiliza. Por não podermos ter tudo. Porque escolher significa deixar algo para trás. Ficamos parados, cresce a sensação de que seria tão fácil, porque qualquer um serve, mas na verdade nenhum vai.

Paradoxo curioso, este tão típico. Podia ser para a esquerda, ou para a direita. Tanto faria. Mas não segue. Que medo é este? Será o do possível arrependimento em potência? De ter deixado para trás outro que não o escolhido? Assim quieto ao menos fica tudo em aberto, incluído o inevitável juízo sobre a escolha.

Ou será que a escolha traz consigo a consequência de talvez não conseguir chegar ao fim? Será que nos brinda com um penálti envenenado? Que enorme baliza, tinha tudo para marcar e falhou, que desastre. Bem mais simples quando é complicado. Porque poucos marcariam. Mas assim tão fácil, que falhanço, céus, que dirão de mim? A papinha toda feita...

As expectativas, como sempre, a empecilhar-nos a realização. O medo do sucesso, ou do quase-sucesso, do que poderia ter sido e não foi. Este é o obstáculo mais forte.

É quem vence esta barreira que produz muito, que tenta tudo, que segue viagem, que vai em frente. Corrigindo mais tarde, para a direita ou esquerda, se a opção inicial foi menos boa, sem que isso se faça notar demasiado. Caminhando em eterna afinação de rumo.


Quem se livra dessas amarras, ganha um dos possíveis, entre tantos à escolha. Quem não avança, ganha apenas a certeza de perder tudo, convencido que ser a forma de nada perder.


Há que poder tentar o novo, com a liberdade de quem joga o jogo da vida com uma boa dose de exploração. Eis o poder de quem se livra das amarras da eterna otimização. Muito visível nos detalhes mais simples do dia-a-dia: no balcão da padaria, um pão diferente que se escolhe. Uma opção no caminho de sempre para casa, mais longe talvez, mas mais bonito, ou apenas fresco, já não passava aqui há tanto tempo. Ou trocando a ordem com que se fazem as coisas da manhã, que estranho o pequeno almoço antes do banho. Ou vice-versa. Nunca tinha comido esta fruta. Nunca tinha vindo a este restaurante. Nunca tinha ido de autocarro. Nunca tinha aceite um convite assim tão sem pensar, queres vir cá jantar no Sábado e eu, que sim, coisa rara, tão sem avaliar bem o puzzle.

A exploração inocente, quase infantil, do novo. Sem funcionalidade aparente. Apenas num fluído existencial mais livre. O possível desperdício convertido numa lufada de ar fresco, mais valiosa que todas as poupanças em detalhe. Porque respirar liberdade é valor. Permite ver, corrigir rumo, permite seguir viagem.

 

 
 
 
 
 
 
Gonçalo Gil Mata
 
 
 

 
(Foto: Torres del Paine, PATAGONIA)
 
 
 

 

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