PESSOAS AOS PEDAÇOS
ARTICLES • 03-12-2014
PESSOAS AOS PEDAÇOS

Sincelejo, COLOMBIA


 
 
Sinto que temos uma certa tendência em detetar aquelas coisas em que ainda estamos aquém. Como se nos medíssemos eternamente por aqueles aspetos em que não somos como devia ser. E eu nem acharia mau essa melhoria contínua - mas seremos justos? Reconhecemos também as partes de nós que são admiráveis?
 
 
Quando penso nisso, sinto difícil encontrar alguém que não tenha um bom par de traços notáveis. Genuínos, geniais, uma expressão sublime da pluralidade do universo. Conjugações magníficas de hábitos e comportamentos que, em dado momento fotográfico, suspenso no tempo, quase estético, nos fazem dizer: este tipo é o máximo! Mesmo que não seja o "tipo" todo. Porque não é. Nunca é. Depois passa, e na outra situação é um tipo impossível porque isto e aquilo. E devia resolver a situação do emprego ou do carro ou da mulher... Parecemos nunca ser integralmente admiráveis. O que nem é assim tão mau. Mas temos que saber olhar sem pudor essa foto em grande zoom, que nos apanha apenas uma curva perfeita de um todo que é tosco, e sabermos, permitirmo-nos admirar. Contemplando quase sem mérito mais uma nossa expressão inspirada de uma fonte inesgotável de perfeição. Aceitar o perfeito que somos, em parte.
 
 
Dá-me a ideia de haver uma certa pressão, invisível, para que todos possamos socialmente caber nas caixinhas em todas as faces. Talvez para ser mais seguro dizer-se "esta pessoa é assim". Para ser "assim" em tudo. Não vá o respeitável senhor doutor afinal estar a dever dinheiro ao cunhado. Não vá o sábio padre afinal brincar com meninos. Penso ser por isso que deixamos os artistas morrer antes de os aclamarmos sem medo...
 
 
E também há quem se perca nesse mar de adequação, de normalização, tentando que todas as fotografias saiam bem. A grande vantagem é que deixa de ser tão mau  nos aspetos em que era mau. A grande desvantagem é que nesse processo o exato oposto também acontece!
 
 
Não vamos por aí. Não percamos a nossa singularidade. Não deixemos por celebrar a genialidade parcial dentro de cada um de nós. Reconheçamos esses nacos de perfeição. Admiremo-nos, pois, aos pedaços...
 
 

 
 
PEOPLE IN PIECES
 
 
I feel we have a certain tendency to detect those things in which we still are far from ideal. As if we eternally measure those aspects in which we are not as it’s supposed to be. And I wouldn’t think this continuous improvement is bad – but are we fair? Are we also acknowledging the parts of us that are admirable?  
 
 
When I think of that, I feel it’s hard to find someone that doesn’t have a couple of notable features. Genuine, genius, a sublime expression of the universe plurality. Magnificent conjugations of habits and behaviors that, in a given photographic moment, suspended in time, almost aesthetic, make us say: this guy is awesome! Even if it’s not the entire “guy”. Because he’s not. Never is. Then it passes, and in another situation he’s impossible bacause of this or that. And he should solve the employment situation, or the one with the car or with his wife… It seems we are never entirely admirable. Wich it’s not that bad. But we must know how to look without shame to that photo in big zoom, that catches only a perfect curve line of a whole that’s uncouth and then know, and allow us to admire it. Contemplating almost without merit one more of ours inspired expressions of an inexhaustible source of perfection. Accepting the perfect we are, in part.
 
 
It seems to me there is a certain tension, invisible, for all of us to be able to socially fit in little boxes in all its sides. Perhaps to be safer to say “this person is like this”. To be “like this” in everything. God forbid the respectable doctor owing money to his brother in law. God forbid the wise priest likes playing with children after all. I think that’s why we let artists dye before we acclaim them without fear.
 
 
There’s also who gets lost in that ocean of adequation, of normalization, trying to be OK in all. The great advantage is that it stops being so bad in the aspects in which it was bad. The great disadvantage is that in that process the exact opposite also happens!
 
 
Let’s not go there. Let’s not lose our singularity. Let’s not stop celebrating the partial genius inside of each one of us. Let’s acknowledge this pieces of perfection. Let’s admire us, then, in pieces…
 
 
1 comment
Ariana Barros
Reagimos ao que nos incomoda. O bom que temos não chateia e, por isso, não é lembrado. Reconhecer "qualidades" é um esforço que temos que nos obrigar a fazer...
in 2014-12-09 14:45:41
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